sexta-feira, 10 de setembro de 2010

O juiz e a emoção: aspectos da lógica da decisão judicial

Excerto da obra de Lídia Reis de Almeida Prado(destacada no título do post), Procuradora e Psicóloga, acerca da influência do psiquismo do Juiz ao decidir.

"No Brasil contemporâneo, não encontramos uma bibliografia extensa sobre a importância dos aspectos psicológicos do juiz na atividade jurisdicional, mas o tema vem sendo abordado qualitativamente de um modo significativo. Assim, o próprio MIGUEL REALE, embora critique o psicologismo jurídico, devido ao seu reducionismo, entende não se limitar a sentença a um simples juízo lógico, enfatizando o que chama de humanidade do juiz na justiça. O autor pondera que, queiram-no ou não os partidários de uma objetividade isenta por parte do magistrado, ela é um juízo valorativo, em que é importante a presença do juiz como ser humano. Lembrar-se dessa contingência talvez seja o primeiro dever do magistrado em sua real e legítima aspiração de atingir o equitativo e justo.¹²
Acrescenta REALE que o juiz não pode deixar de ser partícipe da vida comum. No ato de sentenciar, quer queira quer não, ele sofre uma tensão ético-psicológica que vem de seu íntimo, do que ele sente e sabe por experiência própria e de seus valores sociais que incidem sobre sua personalidade. A seguir, lembra ADAM SMITH, um dos fundadores da Ciência Econômica, para quem o ato de julgar é muito difícil, porque pressupõe a capacidade de colocar-se no lugar do outro. O juiz deve ser imparcial, mas o acerto de sua decisão depende, segundo REALE, dessa capacidade psicológica. Por isso, conclui¹³ que o segredo da justiça está no fato de o juiz saber que a neutralidade não significa fugir das pessoas em litígio, mas se colocar na posição deles.
Por sua vez o juiz REANTO NALINI, Conselheiro da Escola Paulista de Magistratura, ao refletir sobre a influência do sentimento na vida humana apesar de sua repressão na cultura, enfatiza:

habitantes de um século gelado. em que saber e paixão são estocados em gavetas distintas da alma, preferimos a distância protetora ao envolvimento. Acreditamos, mais que nunca, que a paixão cega. Não podemos mais tomá-la pelo que de fato é: uma fonte de iluminação. 14

Entende NALINI, que realiza um diligente trabalho no aperfeiçoamento da formação dos juízes, serem requisitos do bom julgador higidez psíquica e o interesse pela natureza humana. 15
Ao discorrer sobre o magistrado e a comunidade, 16 o autor afirma que o juiz moderno deve ter, como pressuposto básico para o exercício da função, uma especial percepção do homem e da realidade, sendo necessário que, na preparação dos julgadores, as Escolas considerem o temperamento, a experiência de vida e o caráter.
Pondera NALINI que o juiz deve proferir a sentença com sentimento e não se reduzir a um mero burocrata repetidor de decisões alheias, com a finalidade de aderir à maioria. Ele acresenta que, embora não haja no Brasil estudos científicos sobre o perfil psicológico do magistrado, a origem social, as contingências familiares, a situação, raça, crença religiosa, refletirão na decisão a ser proferida, ao lado das influências psicológicas (traços da personalidade e preconceitos).17
Como a função de dirimir é muito desgastante, NALINI sugere a implantação de um serviço de acompanhamento psicológico ao juiz. Tal providência seria muito útil para a Justiça, pois permitiria ao julgador entrar em contato com os próprios preconceitos e vulnerabilidades, percebendo-se um ser sensível. Muitos problemas resultantes de disponibilidades dos magistrados seriam evitados se os juízes tivessem recebido orientação psiquiátrica, terapia psicanalítica ou um acompanhamento profissional.18
O autor conclui que a exigência legal de uma conduta privada irrepreensível torna o magistrado muito crítico em relação a pessoas com comportamentos flexíveis. Apegado à dogmática do direito objetivo, convence-se das verdades axiomáticas e protege-se na couraça da ordem e da pretensa neutralidade. A percela de poder a ele confiada e a possibilidade de decidir sobre o destino alheio, tornam-no prepotente: é reverenciado pelos advogados e servidores, temido pelas partes, distante de todos. Considerando-se predestinado e dono do futuro das partes no processo, revela-se desumano, mero técnico eficiente e pouco humilde, 'esquecido da matéria-prima das demandas: as dores, sofrimentos e tragédias humanas'."19 (PRADO, Lídia Reis de Almeida. O juiz e a emoção: aspectos da lógica da decisão judicial, 5ª ed. Campinas/SP: Millennium Editora, 2010. pp. 22/4)

Um comentário:

  1. Vc me convidou e eu apareci.
    No último capítulo desse livro, a autora transcreveu minha sentença sobre o celular do carpinteiro.
    Parabéns pelo blog.
    Abs.

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